terça-feira, 20 de julho de 2010

Texto desconcertante de Cláudio Oliver!

Por quê eu desisti de servir os pobres



Quem me conhece e sabe de toda minha trajetória de vida deve achar no mínimo curioso o título acima. Minha família tem como referência central as figuras de meu avô e minha avó paternos que foram fundadores do Exército da Salvação no Brasil. Vidas dedicadas a mendigos, prostitutas, e de maneira especial aos orfãos, enfermos e renegados. Minha paixão adolescente se viu conquistada por lutas contra a pobreza, a fome e a injustiça e desde quando me casei, há 25 anos atrás, estive envolvido com servir em favelas, a estudantes pobres, populações carentes, mendigos, bairros periféricos, desempregados e pessoas sem renda. Tenho no currículo o fato de ter ajudado a gerar renda, facilitar a organização de famílias, feito pontes entre ricos e pobres, alimentado pessoas e dado a oportunidade de que outros descobrissem profissões, estudassem e transformassem seu futuro. “Empoderar” as pessoas, foi um dia um dos pontos chave de minha prática de não criar dependência. Depois de tudo isso, sou chamado a questionar toda a vida e a desistir de servir aos pobres.

Ao longo da vida guardo o hábito de sempre perguntar se o que estou fazendo tem sentido, se diante de meu Senhor e Deus estou com meu coração alinhado à Sua vontade, se não estou errando o alvo. Sigo com disciplina a regra dos três “por quês”, que pergunta a cada resposta dada o tipo de pergunta que só as crianças sabem fazer e que me auxilia a gerar um vetor de mudança permanente, de auto-crítica e de realinhamentos pessoais. Assim, a cada etapa, ao fazer cada coisa pergunto: Por quê? E qualquer que seja a resposta, a ela de novo pergunto: Por quê? Me sinto no caminho quando aquilo que faço ultrapassar o terceiro por quê, e daí sigo adiante.

Já faz algum tempo me pus a refletir sobre a vida de Jesus, sobre o princípio da Kenosis, ou esvaziamento, baseado no texto de Filipenses 2:1-11, sobre a encarnação de Jesus na realidade e sobre os inúmeros contatos e conversas dele com gente tão miserável como os leprosos e tão ricas como publicanos, chefes de sinagoga e príncipes de seu povo; com famílias da classe média, com proprietários e com servos e mendigos. Sobre o que ele via e como agia. E tudo isso foi crescendo e me fazendo pensar no texto de Mateus 5, de ele dizer aos pobres que mantivessem suas vidas no caminho e animados por serem pobres, por que deles era a possibilidade de terem a vida dirigida e controlada por Deus e perceberem Sua boa e perfeita vontade.

Devagar, nos últimos anos, além da reflexão bíblica, tenho observado o quanto vários amigos extremamente sinceros vem e vão, se empolgam e começam a servir e logo se ocupam de volta com seus afazeres e preocupações. Vejo também com que freqüência alguns outros pagam para que alguém cumpra o serviço de Deus e fazem isso por tempos determinados e movidos da maior das sinceridades, ainda que de longe e sem envolvimento pessoal.

De uma outra perspectiva observo o quanto a pobreza se entranha na vida dos pobres, e quanto esta somente revela muitas vezes seu desejo mal sucedido de possuir, de ter acesso ao consumo destruidor de tudo, de como sua situação se constrói pela sedução das mesmas coisas que seduzem e destroem os ricos. O mesmo individualismo, o mesmo egoísmo, a mesma tendência a sentir-se confortável e identificado com a posse das coisas. E a adesão inegociável a um estilo de vida e modo de pensar que os prende ao mito da necessidade moderna, ao desejo mítico de evoluir e à submissão ao mito do desenvolvimento.

Igualmente a ricos, pobres e remediados, o mesmo convencimento de que o que precisam é de algo que o mercado, o dinheiro, o governo ou alguma agência pode lhes oferecer. Que serão felizes com a posse, com a pança cheia (uns com pão, outros com brioches) e com o fluir permanente do dinheiro que tudo pode e tudo resolve. E dentre estes, alguns bem intencionados estendem a mão para “incluir” outros no estilo de vida ou no patamar que alcançaram. À mão estendida de cima para baixo, chamamos serviço.

Descobri ao longo dos anos que a própria posição de servir aos pobres, de compromisso com a libertação, estava cheia de superioridade, daquele tipo de superioridade que se traduz por dar ao outro o que eu tenho, uma vez que sutilmente assumo com meus atos que o que eu tenho ou faço era o que ele deveria ter ou fazer, uma tradução percebida na sutil arrogância das tais políticas de “inclusão”, sempre buscando colocar o outro dentro da caixa onde vivo, incluído no meu estilo de vida.

Tudo isso foi me levando a desistir de servir os pobres. Ainda que nem de longe me alinhando com aqueles que a este ponto, do alto de sua riqueza, conforto e bem estar possam estar dizendo “ta vendo? É isso que eu sempre pensei.” Lamento informar a estes que nem de longe creio em seu estilo de vida separado do contato com o pobre, com o desvalido, o faminto, o nu, o feio, o mal cheiroso, o inculto e o bárbaro. Não me alinho com aqueles que pagam seus impostos ou contribuem para caridade dizendo assim estar cumprindo seu papel. Não é disso que falo. A estes continuo retransmitindo a mensagem de Jesus, confrontadora de seu estilo de vida cego, insensível e arrogante, uma mensagem que chama de loucura aquilo que estes chamam de segurança.

Desisti de servir os pobres por outra razão.

Desde 1993, quando saí para as ruas com um bando de meninos e meninas na direção das populações de rua, havia desenvolvido uma mística de, a cada saída nas noites frias de minha cidade, não ir encontrar mendigos, ou carentes. Sempre dizia aos garotos àquela época que eu nunca me disporia a servir pão a um mendigo, ou fazer-lhe a cama, ou vestir sua nudez. Nosso moto, naquele tempo, era “encontrando Jesus na pessoa do pobre mais pobre”. Servir, alimentar e vestir Jesus era nossa motivação, isso sim me animava. E descobrimos com aquelas saídas, que a cada encontro desse com um Jesus assim disfarçado, que os chamados miseráveis se transformavam em mestres, em denunciadores de nossa miséria pessoal, de desmascaradores de nossos mecanismos de manipulação e nos víamos, de repente, espelhados neles, usando as mesmas desculpas, mentiras e escaramuças para ter o que queríamos. Talvez com um pouco mais de sucesso, e certamente simplesmente com mais sorte social, e mecanismos de segurança. Mas descobrimos à época, que nós éramos eles.

Aqueles que se descobriram assim, se libertaram, cresceram e mudaram. Confrontados por Jesus e ensinados por ele no contato com suas próprias pobrezas e misérias, descobrimos, muitos de nós, o que eram boas novas. Naquele tempo, e daquele tempo, muitos fomos transformados pelo toque de Jesus e pela boa nova que ele nos tinha a transmitir como pobres que nos descobrimos.

No entanto, nem sempre esta mística foi mantida como chama acesa, voltei tantas vezes a servir aos pobres, a me deixar levar pela possibilidade de estar na posição de ajudador e fui me esquecendo muitas vezes de minha própria miséria.

Como disse acima, ficar longe dos pobres e julgar suas atitudes e descaminhos do alto do conforto de minha posição social superior não é a alternativa que exponho aqui. Ajudar os pobres, conscientizá-los e incluí-los se mostra um mito, mais um daqueles nascidos no desenvolvimentismo dos últimos 60 anos. A alternativa que apresento é outra, traduzida no encontro, no reconhecimento e na identificação.

Desisti de ajudar os pobres, de servi-los e de salva-los. E isso porque tenho re-descoberto uma verdade dura: a de que Jesus não tem nenhuma boa notícia para quem serve os pobres. Jesus não veio trazer boas notícias a quem serve os pobres, ele trouxe uma boa notícia aos pobres. Ele não tem nada a dizer a outros salvadores, a quem disputa com Ele o cargo de Messias, de Redentor. A agenda de Jesus só traz uma mensagem aos que se reconhecem pobres, nus, feridos, cansados, sobrecarregados, carentes e sem esperança. Aos demais, sua agenda tem pouco ou nada a oferecer

A única maneira de permanecer com os pobres é se descobrimos que somos nós mesmos os miseráveis, é se reconhecemos a nós mesmos, ainda que bem disfarçados, naquele que está diante de nossos olhos. Ao encontrarmos neles nossa miséria, ao nos dar-mos conta de nossa carência, da desesperada necessidade de sermos salvos, ai nos encontramos com a agenda de Jesus.

Deus não se apresenta em nossa capacidade de curar, mas em nossa necessidade de sermos curados. Descobrir esta nossa fraqueza nos coloca sem nada para oferecer, servir, doar, mas revela nossa necessidade de sermos amados, curados e restaurados.

Por ai é que faz sentido que o poder que existe em nós não é o poder de nossas capacidades e riqueza, mas o poder residente em nossa miséria pessoal, tão bem escondida e disfarçada em nossas posses e estabilidade. Como diz Jean Vanier em um livro que li recentemente: “Somos chamados a descobrir que Deus pode trazer paz, compaixão e amor através de nossas feridas”

Como passou a fazer sentido o texto que fala do Messias, e que diz: pelas suas pisaduras, fomos sarados. Os demais messias tendem a escapar do exemplo de Jesus de esvaziar-se a tal ponto de ser um de nós, de morrer conosco e de abrir assim a porta da ressurreição para nós.

O poder que Jesus usou para nos curar e continuar curando não reside em seu acesso ao poder universal, mas em sua identificação conosco na cruz. Em se abrir em chagas e feridas, em se tornar um de nós, em viver nossa vida.

Desisti de servir aos pobres. Estou voltando a encontrar os pobres e me encontrar neles. Voltei a descobrir a miséria que se esconde nas vidas bem montadas de nossa falsa segurança. E com isso posso entender o Jesus que fala com leprosos e com ricos homens de negócios, com cobradores de impostos em suas festas e com enfermos miseráveis. Em sua identificação com todos e cada um Ele via o que talvez mais ninguém via: a extrema miséria e pobreza da condição humana, independente de qualquer status ou roupagem social.

Passei a reencontrar minha pobreza, a me ver em cada situação de miséria, e de me colocar em contato com minhas dores internas. Dali clamar por cura, libertação, comunidade e amor. Pedir misericórdia e ser restaurado.

Quem serve, serve de cima, Jesus nos chama a encarnar a nos vermos no outro e a nos colocarmos por baixo. A deixar de confiar em nossa capacidade e mudar o rumo para irmos ao encontro de nossas feridas e dores. De lá descobrir o poder que existe em sermos menos e não mais.

Desisti de servir aos pobres. Voltei a descobrir minha pobreza. E com ela posso clamar: “Filho de Davi, tem misericórdia de mim”.

Texto escrito pelo autor no blog Na Rua com Deus e dica do Paulo Brabo do blog Bacia das Almas

quinta-feira, 15 de julho de 2010

"Casamento" Homossexual

Ontem, o senado argentino aprovou o “casamento” entre pessoas do mesmo sexo, sendo nossos irmãos os primeiros na América latina a aprovar esta união. Diante desta nova realidade, qual deve ser a postura da igreja de Cristo?

Temos que reconhecer que os homossexuais são cidadãos como outros quaisquer e, por isso, sujeitos de direitos e de deveres dentro de nossa sociedade. É inconcebível que pessoas que se dizem seguidores de Cristo concordem com ações que venham aviltar a dignidade de qualquer ser humano. Devemos tratar esta situação pelo parâmetro do amor – que não implica concordar com tal prática.

Sinceramente, não estou preocupado se o Brasil vai ou não vai aprovar a união homossexual, pois é mais uma lei, entre tantas, que contraria as boas novas de Cristo. Aliás, é provável que todo o nosso ordenamento jurídico tenha em seu bojo o espírito do deus deste século. O que me preocupa é perceber que os homossexuais estão indo além da busca dos seus direitos. Eles querem silenciar as vozes dissonantes, rotulando qualquer um que ouse discordar da sua visão de mundo. Ou seja, se você discorda, logo você é fundamentalista, conservador, ignorante, retrógrado... Resumindo: religioso. Não querem somente o reconhecimento de seus direitos como qualquer outro cidadão. Exigem direitos que nenhuma outra parcela da sociedade tem - o de que ninguém discorde das suas posições.

A igreja se levanta contra o homossexualismo, assim como deve se levantar contra a prostituição, o adultério, a mentira etc. Todavia deve acolher o homossexual, o prostituto e a prostituta, o adúltero e a adúltera, o mentiroso e a mentirosa. A igreja deve ser um lugar de inclusão em amor e santidade. Primeiro ame, depois faça o que quiseres.

Creio que foi Voltaire quem disse: “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las”. É esse princípio tão importante para o nosso estado de direito, que não concordo vê-lo sepultado. Nem pelos religiosos, nem pelos homossexuais.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Texto de Elienail Cabral Junior - de tirar o fôlego!

O FIM DOS SERMÕES


13/07/2010 in Em prosa e verso
Há um limite para a convivência das expectativas da multidão e a linguagem lúdica de um sonhador. Pode se manter muita gente por perto, bastante tempo, contando histórias. Respondendo com novas e escorregadias perguntas, distraindo com meias palavras, usando as mesmas figuras para indicar outras imagens. O Reino de Deus, invisível. Fermento para o bolo. Um grão de mostarda. A luz no candeeiro. O sal. Um casamento surpreendente. Outra coisa com as mesmas palavras. Parábolas que postergam os julgamentos, que iludem a ilusão (Kierkegaard).
Mas há um ponto de fervura em toda esperança adiada. Um prazo estreito para o encantamento popular, quando a violência adormecida de todos acorda. Parece que é o que está acontecendo. Ninguém pede mais sinais. Nenhuma nova pergunta é feita e sequer mais uma história é tolerada. Antes, cercado por demandas, agora, rodeado por suspeitas.
Se o apetite por poder não é saciado, aquele que a todos distraiu, de quem nunca se deixou de esperar a mais vulgar e velada satisfação, deve ser consumido nas aspirações desapontadas da turba. Se Jesus não é o Cristo que se reivindica, Barrabás.
Um ídolo não tem o direito de não ser.
Não dá para não trair alguém que tinha tudo para ser o que todos esperavam. Não dá para não repudiar aquele com quem se decepcionou nas mais doces fantasias. Não dá para não condenar aquele que não consentiu com mais uma ilusão.
Um ídolo não tem o direito de se mover.
Todo líder é constituído em um jogo erótico. E toda intriga é uma pornografia. Ninguém toca no assunto, mas todos esperam secretamente que ele seja o que ninguém consegue ser. Este é o segredo que excita os ajuntamentos. Mas, se alguém acende a luz e frustra o fetiche coletivo, retomam-se as sombras, agora para destruir. Odeia-se quem não se deixou amar com máscara. Este é o segredo que perpetua as taras para os próximos ajuntamentos.
Por isso o insinuante beijo de Judas virá. Estalará como um tapa, cheio de um estranho sadismo. A primeira e mais ardida bofetada que o Filho do homem terá recebido.
As palavras de Jesus estão gastas. O prazo se esgotou. Tudo o que diz, desde então nada fala. As multidões atraídas por ele, agora o repelem. Resta o lugar de poucos, o espaço dos amigos. Quem sabe? Jesus se faz anfitrião e põe a mesa. Oferece pão, ainda que ninguém aparente chegar à saciedade. Enche as taças, que insistem em parecer vazias. Cheios estão os corações, mas de diabos. Sente-se sozinho também em casa.
O limite das palavras é um convite para os gestos de amor.
As palavras, amordaçadas, descobrem que o amor se expressa a despeito delas. Silenciosamente, Jesus encena o último sermão antes da cruz. Despe-se da capa para ocupar o lugar discretíssimo do servo. O mestre lava os pés dos discípulos. As mãos de um Deus calado conversam com os pés trôpegos da humanidade.
Nunca se olhou tanto para baixo como no dia em que Deus ficou de cócoras. Quem quisesse olhar para o céu a procura de Deus teria que vê-lo refletido nas águas turvas da bacia sobre o chão. E os pés sujos e vacilantes da humanidade, finalmente, imersos no céu gracioso de Deus.
Por um instante, vendo-o prostrado, alguém entre os discípulos, muito constrangido, se lembrou do que ouviu do próprio Jesus. Que um diabo, em um deserto, tentou fazê-lo se prostrar por poder e fama e ele recusou. Assustado, chegou a pensar: não se prostrou diante da fama para ser ouvido, mas se curvou diante de pessoas para amar… E teve medo do futuro. Do que teria que fazer com todos os seus planos.


Elienai Cabral Junior

Não deixe de visitar seu sítio: http://elienaijr.wordpress.com/

domingo, 11 de julho de 2010

Igreja e Estado

Às vezes quero acreditar que a história é cíclica, isto é, de tempos em tempos os fatos se repetem numa cadeia sem fim. Isto, ou continuamos a repetir os mesmos erros de sempre – teimamos em não aprender com o passado.

A história nos mostra o quanto foi danoso para o evangelho, quando através de Constantino o cristianismo se confundiu com o Estado, aliás, o cristianismo surge neste exato momento. A partir daí as boas novas do reino foram sendo usadas para perpetuação de sistemas que em nada condiziam com o verdadeiro reino de Deus inaugurado por seu Filho.

Digo isto porque a nota comum hoje no meio dos “cristãos” é que não podemos estar deitados em berço esplêndido, enquanto desperdiçamos o potencial eleitoral que temos, votando em candidatos não-cristãos. Candidatos estes que querem aprovar leis que irão trazer uma nova onda de perseguição aos cristãos e jogá-los novamente às feras.Ou, pior ainda, obrigar-nos a aceitar casamento de homossexuais.

No entanto, o que temos visto são esses defensores dos valores e da moral cristã serem contados entre tantos que eternizam práticas desonestas com o que é público, quando não, são omissos no enfrentamento às políticas que favorecem meia dúzia de protegidos, que oprimem o pobre, roubando-lhe um futuro digno, que exterminam vidas sem pegar em uma arma de fogo. É assim que pretendem criar uma república tupiniquim cristianizada para então concretizarem o reino de Deus aqui nos trópicos. Diante de cenários como este, tem razão quem diz que toda ideologia nasce como um movimento, depois se transforma num comércio e por fim vira uma quadrilha.

A história é linear. E é por isso que somos responsáveis pela transformação de toda estrutura social comprometida com tais práticas. Seja na associação de moradores, no sindicato de trabalhadores, nas organizações empresariais, e - pasmem todos – na política. Isso na política! Mas política que vise o bem comum, que resgate a dignidade do homem, que nos torne gente. Religião e Política, sim. Igreja e Estado, não!

quinta-feira, 8 de julho de 2010

deus do Gozo

28/06/2010

"A possibilidade de nos satisfazermos sexualmente era o que mais desejávamos. E, sendo jovens, além de revolucionários, não conseguíamos avaliar o lado negativo do nosso culto ao Deus gozo"
Lembro sem saudade de maio de 68 que Paris exportava e nós, paulistas, secundávamos na Universidade de São Paulo - mais precisamente na Rua Maria Antônia, onde tomamos as salas de aula para os nossos propósitos libertários e o sexo rolava solto. Aquele maio não foi só uma festa, foi também o tempo do aborto clandestino e da doença venérea que o ginecologista diagnosticava dando graças aos céus que a penicilina existia: "Comece a tomar imediatamente".
Nós endeusávamos o gozo, como os hebreus endeusavam o bezerro de ouro. Éramos contrários ao materialismo, mas servos do sexo e do êxtase que ele nos propiciava. Sem saber, confundíamos o apego ao gozo com a liberdade. Não sabíamos nem queríamos saber. já que, depois de séculos de repressão. a liberação sexual era urgente. Nós éramos "revolucionários". e nenhuma consideração contrária aos nossos propósitos nos interessava
A possibilidade de nos satisfazermos sexualmente como bem entendêssemos era o que mais desejávamos. E, sendo jovens. além de revolucionários, não estávamos em condições de avaliar o lado negativo do nosso culto ao Deus gozo. que nem a AIDS conseguiu abalar. Raros foram os que adotaram logo as medidas preventivas recomendadas e muitos os que fizeram pouco delas -inclusive médicos e psicanalistas. Testemunhei o descaso com horror.
O sexo não é inócuo. Não é propriamente um cordeirinho do bom pastor, e a liberdade conquistada nos anos 60 impõe o "não" ao outro e a si mesmo. Quer dizer, para que a sexualidade não seja uma negação da vida. a liberdade impõe a contenção. Quando não há mais proibição externa, cabe a cada um colocar o limite para o outro e para si. Não é fácil porque não somos educados para nos conter. Pelo contrário, a sociedade em que vivemos incita à desmesura. O que é o problema da obesidade, a que estamos cada vez mais expostos, senão uma doença da sociedade de consumo? Nos Estados Unidos, ela é hoje uma questão social grave.
O controle da pulsão a gente aprende na infância. A propósito disso. Montaigne escreveu nos Ensaios: "(...) os nossos maiores vícios se originam na mais tenra infância e a orientação do nosso caráter está principalmente nas mãos da babá. As mães consideram um passatempo ver a criança (...) ferir, brincando, um gato ou um cachorro. Certos pais são tolos a ponto de considerar que o fato de o filho bater (...) num criado é o feliz sinal anunciador de uma alma marcial e que enganar o companheiro, sendo maldoso e desleal, é um sinal de inteligência". Ou seja, a EDUCAÇÃO SEXUAL começa bem antes de a sexualidade despontar e a valorização do descontrole da criança é um crime. Os pais podem inclusive ser responsabilizados pelo apego desmesurado do filho ao gozo, cujas consequências são sempre danosas e, às vezes. letais.

A psicanalista e escritora Betty Milan assina a coluna Consultório Sentimental em VEIA.com. uma vez por mês, ela publica em VEJA um artigo especialmente escrito para a revista impressa.

28/06/2010

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Resolvo hoje aventurar-me neste admirável mundo, já não tão novo, na tentativa de partilhar minhas inquietações com relação a vida. Não adjetivo a vida - como cristã -, pois comungo da crença que não existe vida cristã, mas tão somente vida.
Nos últimos anos tenho repensado minha caminhada como ser humano neste mundo dos viventes. Há em mim um inconformismo diante de alguns paradoxos entre fatos da vida e crenças herdadas.Por isso procuro uma espiritualidade que seja compatível com o modo de vida de Jesus.
Luto diariamente contra as amarras da religião que durante muito tempo foi minha segunda pele.Sei quanto posso ser levado e influenciado pelas lisonjas da religiosidade. Se tem um inimigo com o qual não posso descuidar, sou eu mesmo.
Estou convicto que para viver, tenho que sempre está me auto examinando tendo como alvo a vida de meu Senhor Jesus Cristo.